domingo, 20 de janeiro de 2013

DESERTO

Minguar, fundir-se sob a luz que jorra
Derreter perante um sol escaldante.
Perder a consciência, bem como a nuvem
Pequeno floco de neve que dá sombra.

Tropeçar em sombras escabrosas
Assentar-se no limiar do desespero.
conhecer a beleza que não morre
Olhando aos pés, grãos cristalinos que queimam.

A luz do altar da fé
Seco a míngua de água, se consome.
É que o lírio da fé já não renasce
Ante os olhos do vago peregrino.

Os lábios sangram.
Os olhos alucinados
Vêem Deus tapar com a mão
O sol abrasador.

Que importa? havemos de passar, seguindo
Não pelo caminho do inferno na luz,
Mas pelo horizonte estrelado
Que a fria mão toca vênus.

Se não tens que esperar do céu
Água para matar tua sede
Num esforço supremo de alma heróica
Prende a imensidão eterna
Em teu olhar Sepulcral.

Duci Medeiros

sexta-feira, 4 de janeiro de 2013

POETA MORTO

Aqui vão os meus versos
Tristes, alegres, contínuos.
Expressam o ser de cada emoção
Não sei dizer quando terminarão.
Talvez quando minha alma
Do meu corpo sair,
Ir para o além do horizonte
Onde meus versos não chegarão
Aos teus olhos, teus ouvidos.
Talvez lá, irei compor
Para os ventos da aurora
Onde os pássaros serão minha voz
As águas meu papel,
O arco-íris meu pincel,
O uivo do silêncio
Meu suspiro de emoção.
Quem me ouviu em vida
Irá sentir-me presente
Na lembrança vivida de meus versos,
Minha lírica na voz silenciosa
De minhas eternas poesias.

Duci Medeiros

JAZ

Despeço-me do pudor na minha glória
Deixo-me alada louca, sem memória
Nudez nascida para história
Uma tentação que desafia a pureza.

Na cor rósea do seio que tenta
Pede, clama uma carícia,
No alto, rente, palpitante do ventre
Um exemplo de fêmea em chamas.

Numa cegueira fácil de vitória
Humaniza contente toda história
Que a fêmea foi feita sob medida
Para os laços e as fitas do amor sem memória.

Enquanto o sangue esquenta o corpo
Veste de inocência a alma
Com instintos presentes
E pensamentos ausentes.

Belo animal que foge ternamente
Abandonando docemente a presa
Nos círculos da paixão ainda presente,
Na carícia final onde a sombra do tempo se faz.

Como uma roseira campestre
Que abre suas pétalas e exala
Depois murcha e morre
No túmulo assim eterniza:

Jaz aqui uma fêmea, fogo e paixão
Que na pureza do momento eterniza
O amor e o tormento.

Duci Medeiros

MELANCOLIA

A poesia que escrevia
Hoje não existe mais,
O sonho que existia
Hoje a realidade se faz.
A fantasia do amor
Na carne padeceu,
Os sonhos de paixão
Na sargeta apodreceu.

A  lírica terminou
O verso no terceto ficou,
A nova estrofe não veio.

O fim da prosa aconteceu,
Quando o sonho nasceu
A realidade fez morrer.

Hoje o papel não viu
O brilho da fantasia,
O que hoje aconteceu
Foi a melancolia.
A vontade de acabar,
Esquecer, padecer se fez
E o lápis caiu.

Duci Medeiros

GALGAR

Galgar a interioridade do ser
É percorrer uma estrada perigosa
Viver intensamente e ver
Toda uma realidade tortuosa.

Pelos precipícios da busca
Encontro os lagos serenos do ser
As verdades da vida
Que perpassam o interior que ver.

Vendo todos os deslizes
Caminho pelos vales onde habita
 A essência  dormente
Que o ego palpita.

Obstáculo, transpasso egoísmo
Pela humildade das montanhas,
Elevando as almas enfermas
Encontro o oásis doando.

Lágrimas, rio que desagua
Pela dor da erosão
Vindo da fonte solidão
Encontra o amor, perdão.

O véu da noite
Cai sobre o mar de solidão
Encontra exposta a essência
Humilde, pede perdão.
Duci Medeiros

terça-feira, 1 de janeiro de 2013

BUSCA

Procurava, sem medo, sem descanso
Por todos os olhos e almas andantes,
Uma busca infinitamente sem esperança
Parecia uma ansiosa criança.

Que na fantasia única da infância
Busca os sonhos que a embalam
E ao mesmo tempo tenta, em vão
Mostrar aos adultos que a cercam
A beleza e a doçura de sua existência.

De tanto buscar em vão,
Percebi de repente que o céu azul e límpido
O mar verde e cristalino e toda criatura existente
Não seriam capaz de me mostrar
O que bem guardado,escondido, estava.

Não! a resposta não está na fantasia
Nem mesmo nos sonhos por mais belos que estes sejam.
A mais simples resposta
Encontrei na alma mais distante
Esta que não procurei, onde menos esperava encontrar.

Nem mesmo todos os espelhos
Para os quais olhei, não refletiram,
Pois simplesmente não quis acreditar
Que ali a felicidade estivesse.

Pois é! tão simples
Que acabei não encontrando,
Mas estava lá, quando parei, olhei
Acabei encontrando-a dentro de mim.

Duci Medeiros

MERGULHO NA GEOGRAFIA INTERNA

Na trilha do seu mundo interior buscando desvendar o ser verdadeiro que se oculta sob o veu das aparências, o homem incursa pelos meandros do inconsciente, percorrendo roteiros ocultos do seu mundo interior.
Vai aos países recônditos das suas profundas experiências, descobrindo os picos da sua insensatez, os perigosos despenhadeiros do seu orgulho e mares de angústia.
Desvendando as imensas florestas dos seus instintos, as catedrais dos seus sentimentos, as imensuráveis cachoeiras de suas revoltas, os grandes desertos de suas frustrações, seus imensos lagos de dúvidas ou seus belos monumentos de possibilidades, este viajante segue ao longo de sua desconhecida geografia interna, a cada passo uma surpresa, a cada momento se descortina uma nova paisagem, cheia de inéditos caminhos que apontam seu eu verdadeiro.
Nada está previsto, nenhum programa está traçado na via do mundo interior e nunca se sabe ao certo o que vai encontrar, se cidadelas de esperança ou metrópoles de desespero.
Podem se deparar com pontes intermináveis que conduzirão ao centro do ser ou com obstáculos imensos que sobrecarregam a difícil caminhada,outras vezes com atalhos que podem antecipar a chegada.
Esta incursão meticulosa e lenta requer muita cautela porque tem rotas que podem precipitar os caminhantes em abismos sem retorno, nas cavernas escuras do inconsciente.
Nesta viagem tudo é surpreendente.
Muitas vezes há uma interrupção na jornada interior, pois nem sempre o viajante está disposto a ir mais além, fica margeando o grande rio com receio de mergulhar fundo.
A senda do mundo interior não é fácil, a viagem exige coragem, pois a maior distância que existe é aquela que separa a criatura de si mesma.
O viajante, muitas vezes, não está disposto a pagar o preço do monumental espetáculo da verdade, pois ainda considera útil o véu da "ignorância" que lhe ofusca a visão da luz interior. Eles acabam adiando o grande encontro por ignorar que o encontro consigo mesmo é o porto seguro para sua libertação.
Desconhecendo sua verdadeira natureza, o viajante sofre os desvios da vereda da sua caminhada, aqui e ali, ele repousa nas ilhas solitárias do seu país interno. Ignorando que precisa transcender as fronteiras da sua autoestima para entrever as regiões esquecidas, ocultadas pelo medo de deparar-se com sua única realidade.
Na serena contemplação do fluxo constante das ondas por onde passeia a essência do seu verdadeiro ser, o viajante recua ante o espetáculo da "destruição" que deixa em aberto todas as faces ocultas. Destruição esta que derruba todas as máscaras  que o homem ergue para disfarçar sua fragilidade diante do mundo e para esconder de si mesmo os recônditos de seu ser.
Quando o homem se vê violentamente privado do direito de se esconder de si mesmo, sua face é refletida ante seu olhar espantado, sua autoconfiança é ulcerada pelo medo, pela insegurança, pela fragilidade de se vê exposto a si mesmo.
Em verdade, a inviolável sombra com que o homem permeia a essência de seu ser difere das paredes de concreto que ele edifica em torno de si, pois afastar o mundo de si é bem mais difícil que construir um abismo entre seu olhar contemplativo e seu eu essencial. Muito embora seja mais fácil desmoronar o muro de concreto do que abrir os olhos para enxergar a si mesmo.
Duci Medeiros